A Garota usurpadora de sentimentos
Pelas não poucas observações de si mesma, ela tem a leve e ligeira impressão, que não sabe imaginar. Tem então sérias dificuldades em criar ambientes inexistentes. Necessita arduamente de uma referência. É sua conclusão.
Sente a necessidade dos Olhos, sente a exigência da sensação na pele, nos poros e nos cabelos que externam-se deles. Não precisa sentir de si, pode vir de outrem, mas tem de vir, de Ser. Ainda que apenas intrínseco a essa pessoa.
Sua fantasia não surge sem ao menos a dúvida de sua realização. Ela tem de sentir que é possível, que a ilusão não é tão ilusória, que pode vir a realizá-la. Ela não sabe ser poeta, não sabe escrever, apenas joga palavras e as une ao acaso, formando então algum sentido subliminar.
Pouco tempo, muitos pensamentos e uma quantidade razoável de sentido. Uma quantidade aceitável de entrega, de indecisão, de descobrimento de si mesma. Nos seus textos se encontra, se percebe, vê aquilo que deseja, aquilo que almeja, aquilo que teme.
Mas se ela expõe é porque acredita que fará diferença, que será uma espécie de magia, feitiço invocador. Acredita em seu íntimo que o ato de pôr para fora ainda que de forma desregular, ainda que com palavras tortas e sem musicalidade ou poesia, terá uma força, um poder de atitude.
A garota suga as sensações dos outros, com uma espécie de força interna, através do toque, de um olhar mais profundo, ou no ato de ouvir uma história. Ela torna-se a protagonista daquelas situações, daqueles momentos. Quase como uma atriz, ela sente outros, toca outros, vive outros.
Veste outras roupas, bebe outras bebidas, come outras comidas, anda em outros lugares, fala de outras formas, sente outros sentimentos, age de forma contrária a si mesma... E então, a partir disso, após o fim do toque; após filtrar de outros olhos; após a história terminar de ser contada, ela então a reconta, da sua forma.
Não importa se a história contada na verdade nunca existiu. Não importa quem a inventou. Ela passou a existir na mente de outra pessoa, passou a ser sentida por essa outra pessoa, então para ela, passou a ser real. Porque para ela, tudo que se sente, é real. Ainda que real apenas para Um alguém.
E no exato momento que ela sente por outrem, ela vive e aprende e chora e ri e se apaixona e ama e sofre e odeia e beija e abraça e sente e então descobre que fazia parte daquela história. Que a história que ela sentiu de outrem, era na verdade dela própria, de forma que, o outro alguém era sua mente contando a história para ela mesma.
A garota usurpadora dos sentimentos alheios era, na verdade, a autora de todas as sensações. Ela pôde então se ver do lado de fora, e descobrir verdadeiramente os desejos mais insistentes, mais ardentes. Percebeu então o quanto de vidas e possibilidades há nela. Se há dúvida, é porque há chance.
Flor de Lótus
27/04/11
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