Os Sentidos
Ele abraçou-me com veemência, necessidade, ardência. Seu rosto, paralelo ao meu, permitia-me aspirar o cheiro de sua camisa lavada, envolvido em seu perfume. Não reconhecia a marca, mas certamente a buscaria em lojas e catálogos. Sentia necessidade de tê-lo após a partida.
Precisava explicitar verbalmente o que se passava em meu corpo, em minha mente. Mas tal qual meus instintos animalescos, assim, e apenas dessa forma, consegui comunicar-me: sussurros, rangidos, respiração ofegante e descompassada. Eram os sons que ecoavam, me entregavam.
Por uma fração de tempo, consegui, após esforço inimaginável, abrir os olhos e comprovar que não se tratava de sonho ou delírio mental, causado pelas substâncias alcoólicas e nicotinas que ingerira toda a tarde. Ele estava em meus braços, ou talvez, eu nos dele. Se é que havia diferença.
O sabor de sua saliva preenchia minha necessidade de líquido, nada mais me era desejado. Os lábios mordidos expunham um aroma característico do vinho que havíamos ingerido, misturado ao sabor do sangue nos cortes abertos pela violência da necessidade. Eu poderia digeri-lo sem ao menos perceber.
E como se o cheiro, os sons, o sabor e a visão me fossem insuficientes, precisava tocá-lo mais fundo, sentir-me parte de sua matéria. No momento em que as roupas eram meras coadjuvantes do ambiente, mesclei-me em seu corpo. Enfim fui completa.
Flor de Lótus
2011