Líquido Volátil
Eu ainda ouço o barulho ensurdecedor
Das ondas formadas pelo vento
De uma noite penumbrosa de inverno.
Aquela sensação insensível,
O som inaudível das vozes tampadas
Pelo líquido volátil que as preenchiam,
Com panos as entupindo
E levando seus cérebros a inconstância,
A imobilidade visual e mental.
Posso sentir o espírito de aputrecendo
Com o éter que alucina o real,
Mas que faz do tempo que rápido se vai
Algo mais intenso e menos doloroso:
Embora abstrato, é verdadeiro.
São seres humanos onde habitam almas
Que futuramente serão espíritos a vagar.
Sinto que falta algo em sua composição,
Algo químico que foi retirado,
E uma outra – embora também voluptuosa – reação
De meus nervos, atos, palavras e reflexos:
Nada que seja importante o suficiente.
Olhos fechados podem ver mais do que existe:
O céu completamente abstinente
Tanto de estrelas quanto de lua,
Que hoje entra em seu primeiro dia de nova:
Seria uma entrada para o passado?
Um futuro prestes a se engrandecer,
Ou se afundar cada vez mais em algo sujo.
Um corte para marcar a falta do que fazer,
Duas ampolas de reserva para necessidades:
Tudo é em vão quando se vai a abstração,
A não ser a sensação de um tempo ganho
Mais um dia de vida que está se destruindo,
Que está se auto-destruíndo.
É o que minha epiderme deixa transparecer
Quando ao me olhar no espelho
Vejo meu reflexo cada dia mais transparente,
Ou quando sinto que a cada dia passado
Meu sangue se dilui entre organismos de evacuação
E sua falta me enfraquece:
Mais do que já sou fraca.
Minha vida que está se esvaindo em areia
Se perdendo em um grande quebra-cabeça,
A falta de sentimentos e o vazio preenchido
Por grandes vazios não preenchíveis.
Eu acordei com tudo igual,
Mas as ampolas e estigma me fizeram ver
Que o que minha epiderme sentia
Era derivado do que a deixei sentir
Primitivamente algumas horas antes.
Flor de Lótus
29/06/03